Estreita janela de oportunidade no Brasil

Se a nova Administração não empreender no seu primeiro ano as reformas necessárias para suster a fragilidade das finanças públicas, as perspetivas deteriorar-se-ão rapidamente.

Madrid - 31-out-2018

A eleição do novo presidente do Brasil põe fim a um longo período de incerteza política que afetou negativamente o sentimento dos investidores e o crescimento económico na maior economia da América Latina. Resta saber se o novo presidente brasileiro será capaz de levar a cabo reformas críticas e urgentes num ambiente muito complexo.

 

 

Em maio, uma greve de dez dias nos transportes paralisou o Brasil, reforçando a crescente frustração com a classe política, a corrupção e as elevadas taxas de criminalidade. A confiança dos investidores na continuidade de uma agenda favorável ao mercado começou a baixar, o que gerou uma desvalorização acentuada do real (25%). Com a eleição de Jair Bolsonaro e a nomeação de um economista defensor do livre mercado, Paulo Guedes, como ministro das Finanças e da Economia, aumentam as probabilidades de continuidade das reformas económicas, mas os desafios são numerosos.

 

Na frente política, a nova Administração enfrenta um Congresso profundamente fragmentado, altamente polarizado e pouco experiente. No novo Parlamento haverá 30 partidos na câmara baixa e 21 no Senado. Os partidos de direita e centro-direita têm uma maioria combinada na câmara baixa de 60%, o suficiente para atingir os três quintos necessários para aprovar emendas constitucionais. Mas nem todos estes deputados estarão alinhados com as políticas do novo Governo. Bolsonaro é uma figura muito controversa e muitos brasileiros estão preocupados com os direitos humanos, as liberdades civis e a liberdade de expressão sob a sua presidência. Portanto, é uma questão aberta se será capaz de construir e gerir coligações de trabalho de modo a impulsionar as reformas muito necessárias, particularmente as que exijam maiorias constitucionais.

 

Na frente económica, os seus principais desafios passam pela sustentabilidade das finanças públicas, pelo aumento das taxas potenciais de crescimento do PIB e por manter a inflação controlada. O défice fiscal do Brasil continua elevado (7,5% em agosto comparado com os 7,8% no final de 2017), elevando a dívida pública para 77% do PIB (74% em 2017). De longe, a medida fiscal mais urgente será a reforma da segurança social, suspensa pelo seu antecessor no início de 2018. Caso contrário, o limite histórico de gastos públicos estabelecido em 2016 será excedido e a relação entre a dívida pública e o PIB continuará a aumentar. A ausência destas reformas faria regressar as pressões inflacionistas. A inflação surpreendeu positivamente nos últimos meses, atingindo os 4,5% em setembro, em grande parte devido aos preços da energia e à desvalorização da moeda antes das eleições.

 

Prevemos que o PIB real comece a recuperar lentamente com um crescimento de 1,1% em 2018 e de 2,3% em 2019. O crescimento económico estagnou após a greve dos camionistas em maio. No entanto, indicadores recentes sugerem que a economia está lentamente a recuperar graças à melhoria da confiança das empresas e dos consumidores. Esta recuperação continuará a ser fraca, na medida em que a taxa de desemprego permanece elevada nos 12% e as exportações diminuem devido a problemas económicos na vizinha Argentina, o terceiro mercado em dimensão das exportações brasileiras.

 

A fragilidade das finanças públicas não deixa espaço para uma política errada. Se a nova Administração não levar a cabo a reforma das pensões e outras medidas fiscais necessárias no primeiro ano, as perspetivas deteriorar-se-ão rapidamente. A janela de oportunidade é muito estreita, dada a grande impopularidade destas medidas e a suscetibilidade da confiança dos investidores. O investimento tornar-se-á relutante, o real perderá valor e as baixas taxas de juros atuais terão de subir, o que seria prejudicial para o crescimento económico. Dito isto, a capacidade de absorção de choques da economia brasileira mantém-se forte, apoiada por uma taxa de câmbio flexível, um setor bancário sólido e reservas oficiais muito elevadas.

 

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